Spiritual Path

Sunday, April 20, 2008

Sobre o tempo e as jabuticabas

Recebi este texto de uma grande amiga que ao ler disse ter se lembrado de mim. Como pode-se ver, amiga eterna. Tinha o recebido de meu ex-marido há algum tempo, quando, nos revezes da vida, avalia-se o que se está fazendo e a falta de paciência para determinadas situações.

Eu, que adoro jaboticaba por ter passado parte da infância sob as jabuticabeiras da casa de minha melhor amiga, não posso esquecer da delícia de desfrutar as últimas frutinhas negras que sobram na bacia. Mas com a certeza de que os galhos estarão ali no dia seguinte repletos de novas bolinhas prontas a se ofertarem. Por ser sulista, minha jabuticaba é jaboticaba, com O, que é redondo, porque uma jaboticaba é muito mais bonita.


Rubem Alves
Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquela menina que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ela chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço. Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados. Não tolero gabolices. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte. Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos. Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos para reverter a miséria do mundo. Não quero que me convidem para eventos de um fim de semana com a proposta de abalar o milênio. Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir estatutos, normas, procedimentos e regimentos internos. Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos. Não quero ver os ponteiros do relógio avançando em reuniões de'confrontação', onde 'tiramos fatos a limpo'.

Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário geral do coral. Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: 'as pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'. Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa...Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados, e deseja tão somente andar ao lado do que é justo. Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade, desfrutar desse amor absolutamente sem fraudes, nunca será perda de tempo. O essencial faz a vida valer a pena.

Breve diálogo entre o teólogo Leonardo Boff e Dalai Lama



Leonardo Boff explica:

"No intervalo de uma mesa-redonda

sobre religião e paz entre os povos,

na qual ambos participávamos,

eu, maliciosamente, mas também

com interesse teológico,

lhe perguntei em meu inglês capenga:

- "Santidade, qual é a melhor religião?"

Esperava que ele dissesse:

"É o budismo tibetano" ou "São as religiões orientais, muito mais antigas do que o cristianismo."

O Dalai Lama fez uma pequena pausa,

deu um sorriso, me olhou bem nos olhos

- o que me desconcertou um pouco,

por que eu sabia da malícia

contida na pergunta -

e afirmou:

"A melhor religião é a que mais

te aproxima de Deus.

É aquela que te faz melhor."

Para sair da perplexidade

diante de tão sábia resposta,

voltei a perguntar:

- "O que me faz melhor?"

Respondeu ele:

- "Aquilo que te faz mais compassivo

(e aí senti a ressonância tibetana, budista,

taoísta de sua resposta),

aquilo que te faz mais sensível,

mais desapegado,

mais amoroso,

mais humanitário,

mais responsável...

A religião que conseguir fazer isso de ti

é a melhor religião..."

Calei, maravilhado,

e até aos dias de hoje

estou ruminando sua resposta

sábia e irrefutável